Monday, February 28, 2005

Não se arranjará uma distracção qualquer?

O estranho deste vício é que consegue simultaneamente tomar posse de nossa vida e ser como se não existisse, ou pelo menos não se manifestar até ao preciso momento em que decidimos prescindir dele.

O cigarro ritual, que se toma após coisas tão diversas quanto um café, uma refeição, ou aquela coisa boa que vem a seguir ao whisky, só surge à superfície quando decidimos manter o ritual e fazer desaparecer o apêndice fumegante.

Apercebemo-nos assim da quantidade de actos quotidianos que foram, neste processo, e sem que tenhamos percebido muito bem como ou porquê, elevados à qualidade de ritual: beber um café (quatro a oito rituais diários), falar ao telefone com um cliente por mais do que dois minutos (idem), reunir com alguém do escritório durante mais do que trinta segundos (seis a vinte rituais semanais). Quando damos por nós, toda a nossa vida é um manancial de rituais, que se sucedem inexoravelmente, e têm como consequência o gesto assassino: apalpar o contorno dos bolsos em busca do maço de tabaco salvador.

Não se arranjará uma distracção qualquer que substitua de forma graciosa estes rituais?
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